2ª narrativa, 1.

Acordou pelas 7am de um sábado, mesmo sem saber porquê, vestiu uma roupa que o fizesse parecer mais importante. Foi a cozinha, abriu o armário, pegou o pote de café, tirou um coador daqueles de pano, que o faziam lembrar do interior de tudo, onde viveu sua infância e preparou seu café. Serviu-se de pão e tomou seu café, como sempre fazia, enquanto lia as manchetes de jornal só para se distrair, sem dar muita atenção para os dados que diziam o que pensar, afinal, isso não mudaria muito sua vida. Desceu as escadas que o levariam ao estacionamento do prédio onde morava, percebeu que deveria ter pego uma blusa, mas mais uma vez não faria tanta diferença, foi ao canto mais escuro do lugar, onde estava sua bicicleta, e como se fosse um gato entre cachorros, estava lá sozinha e acanhada entre os carros que vomitam CO2 , nem correntes ou cadeados eram necessários, ninguém nos dias de hoje quer uma bicicleta daquelas sem marchas com um banquinho solidário atrás para aquele amigo folgado que nunca quer andar 2km até sua casa.
Saiu pela rua com os fones em seus ouvidos, escutava o que classificava como música, The Beatles. Virou duas ruas a esquerda, e deu de frente com a avenida principal que sempre desafia as humildes e inofensivas bicicletas, 50min desde que acordara já tinham se passado, e ainda não tinha notado que era sábado, e que não tinha que ir trabalhar. Fez o caminho que sempre faz, 5km rápidos e limpos de CO2, caminho habitual de poucas curvas, só percebeu que não sabia o que estava fazendo quando avistou o parque que fica em frente ao homérico prédio onde trabalha, andou mais 200m e encostou a bicicleta em um poste na calçada, colocou a mão no bolso, tirou o celular e olhou a data: 1º/09/2001, um sábado. 8Am, agora que tinha percebido que não tinha a obrigação de subir os 15 andares, sentar-se na mesa, ligar o computador e ler todos os e-mails que tinham a intenção de fazê-lo se sentir inferior, decidiu que atravessaria a passarela em direção ao parque, sentaria em um banco, e ficaria confortável com o tudo e o nada que é, simplesmente quieto. Fez o que queria, sentou-se no banco, e sem se importar com as horas que demoravam a passar, sob a sombra de uma árvore centenária observou a forma com que cada um vivia os momentos em que podiam idealizar os próprios caminhos, e suas decisões eram 100% suas, e não buscavam agradar a ninguém. Em pouco tempo, uma pergunta saltou a seus pensamentos, e todos se perguntam isso a todo momento de suas vidas mesmo sem perceber; só queria saber se vivia cada momento como deveria. Ninguém, nunca sabe, quando vai ser seu último abraço, seu último “te amo”, mas para ele isso não parecia um grande e atormentador problema. Já não faria diferença o que havia sido feito. Só queria viver da melhor forma, partindo de agora. Não há nada que se faça e que mude nosso destino que quase nunca nos é revelado antes que tudo aconteça, é necessário, mais do que nunca, viver e ver para crer.
Passou a manhã no banco, e tinha presenciado momentos suficientes para escrever um livro. Só não achava que alguma coisa mudaria sua forma de pensar, mais uma vez. Nada parecia grande o suficiente para que sua mente fosse mudada, algo muito profundo já havia coagulado algumas áreas de sua razão e de seus sentimentos. Não havia razão que mudasse o quão conformado estava com a “realidade”, não a sua realidade. 


PS: ainda não terminei a primeira narrativa do Pê e da Isa. 

Shakespeare

Quando na crônica do tempo que passou
Eu leio as descrições dos seres mais formosos
E as antigas rimas que a beleza embelezou
Para louvar ou damas ou homens garbosos,
Vejo que no melhor da doce formosura,
Em mão ou pé, em lábio ou fronte, ou 
num olhar,
Uma 
beleza tal como a que em ti fulgura
Foi o que a pena antiga ambicionou mostrar.
Assim, todo o louvor é apenas predição
Do nosso tempo, pois tão-só te prefigura,
E como o antigo olhar foi só 
divinação,
Não pode levantar seu verso à tua altura.
Mas nós, os vivos, que podemos te admirar,

Não temos palavras que te possam celebrar.
por William Shakespeare
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"Acho que ele era apaixonado pela Jade." 
Te amo.