O carnaval é a festa popular mais
conhecida do Brasil. Sua importância transpassa os limites turísticos e
econômicos atingindo em cheio a realidade que é destruída na e pela desordem
carnavalesca: é a cultura do país que invade as ruas, com seus preconceitos e
lutas.
A festa é pautada essencialmente na
desordem. Homens vestem-se de mulher, a alta burguesia das cidades larga os
trajes engravatados no armário e peregrina pelas ruas usando chinelos e
fantasias, a parcela marginalizada – e cativa da opressão – traveste-se de
nobreza e o cinza cotidiano é transformado em um mar colorido de encher os
olhos de qualquer gringo que passe por aqui entre fevereiro e março.
É evidente que a desordem planejada
pretende esconder e driblar a sofrível, e tão famosa quanto a festa, realidade
brasileira utilizando-se de artifícios efemeramente divertidos. Altera-se o
grau de consciência e assim o fardo da vida é algo suportável. Não se pode analisar
a festa de maneira coerente sem ter clareza de seu propósito supracitado.
Diz-se que é necessário enlouquecer
por alguns momentos para que se possa viver de maneira sã a maior parte dos
dias. Nada mais natural do que uma festa como o carnaval, nada mais adequado
que o carnaval. Talvez nada seja melhor ou mais brasileiro do que essa festa,
principalmente aos olhos dos que vivem oprimidos por uma realidade machista,
racista, homofóbica e ditadora.
Esconder-se em personagens, fingir
ser parte de outra realidade, abrir mão de ser real, esquecer de si mesmo e
festejar a oportunidade de fazer isso tudo. O brasileiro faz isso sempre. 365
dias ao ano. A diferença é que geralmente o faz para sobreviver, durante o
carnaval é só diversão, mas acaba configurando também um brado revoltoso.
Esse
é o carnaval e não se deve exigi-lo mais que isso.